terça-feira, 27 de maio de 2008

Será Que Você Pode Fazer Diferença?

Suboficial R1 John P. Hearn, USAF
Os Supervisores, na Força Aérea, costumam recompensar seus subordinados por desempenho extraordinário. As condecorações que eles conferem representam expressões tangíveis de gratidão. Muitas vezes, contudo, os supervisores sequer chegam a perceber o efeito que fazem nos subordinados.
O melhor elogio que já recebi foi de um dos meus antigos subordinados. Quando estava sob minha chefia, ele era um soldado de primeira classe. É, atualmente, um senior master sergeant. Certa vez ele me disse que, não fosse por minha causa, teria pedido baixa da Força Aérea. Não salvei sua vida em um ato glorioso; ao contrário, travei com ele diversas conversas interessantes a respeito de suas atitudes e de seus métodos de comunicar-se com militares de diferentes níveis hierárquicos da Força Aérea. Na qualidade de sargento da seção de investigação e justiça, ele freqüentemente tinha oportunidade de brilhar quando em contato com outras pessoas na base. Como servimos juntos em uma missão temporária na Coréia, só tive alguns meses para interagir com ele, antes que ele fosse designado para outra função. Anos mais tarde, ele me disse como influenciei sua vida—disse-me que meu exemplo o havia inspirado. Que coisa maravilhosa! Em essência, tive êxito em uma das funções que a Força Aérea me remunera para exercer porque parte do trabalho de um líder envolve preparar os subordinados para serem futuros líderes.
Às vezes, as ações de uma pessoa influenciam a missão da Força Aérea muito além do que é exigido pelas atribuições da função que ela exerce. Por exemplo, no final da primavera de 1957, no primeiro dia de orientação a candidatos à admissão à Academia da Força Aérea dos EUA, um jovem subiu em uma balança de uma clínica ali localizada. O enfermeiro auxiliar—um soldado de primeira classe que havia atendido a milhares de candidatos—deslizou lentamente o contrapeso ao longo da escala graduada, até o ponto em que ela se equilibrou: “cento e quinze libras, Major”, disse ele. O médico anotou a informação em uma folha do prontuário do candidato e comentou: “você não vai conseguir, garoto. O peso mínimo exigido para admissão à academia é de 120 libras. Você vai ter que chegar a isso quando se pesar novamente no final da semana”. Arrasado com esta informação, o jovem pensou em seu pai, que se havia engajado no Exército e servido durante toda a Segunda Guerra Mundial, obtendo a patente de oficial e, finalmente, passando para a reserva como coronel. Seu pai tinha, para ele, altas expectativas e havia se esforçado muito para conseguir a indicação para a academia. Como poderia ele dizer-lhe que fracassara em alcançar os padrões de admissão?
Percebendo o desespero no olhar do jovem, o enfermeiro auxiliar lhe disse que esperasse fora do consultório. Quando o médico fez uma pausa, ele foi ver o jovem e disse-lhe: “Ouça-me. Depois do almoço, procure o sargento do rancho. Diga-lhe que eu o mandei procurá-lo e conte seu problema; ele vai cuidar de você.”
Nas instalações do refeitório da Academia, o sargento do rancho—gordo, com a barba por fazer e com dificuldade de expressar-se—ouviu pacientemente a queixa do candidato e disse: “ok, garoto, basta você comer o que eu puser no seu prato.” Durante a semana, o sargento fez questão de encher o prato do jovem de massas, comidas gordurosas, bananas e carboidratos—alimentos que, na Força Aérea de hoje, fariam um nutricionista ter um enfarte. Embora o candidato se empanturrasse a cada refeição, as atividades físicas intensas acumuladas no programa de orientação impediam-no de ganhar peso. No final da semana, o jovem deitou-se na cama pensando no futuro, preocupado com o exame físico do dia seguinte.
Pouco antes do almoço, o candidato entrou no consultório para ser pesado. Mais cedo, ele se havia pesado, vendo, com alegria, que estava acima de 120 libras. Agora, contudo, no consultório, ele ouviu o enfermeiro auxiliar anunciar: “Cento e dezoito libras, Major”. O médico fez o apontamento final na folha do prontuário do candidato e olhou para ele: “veja, garoto, eu lhe disse que você não conseguiria.” Então, jogou o prontuário na pilha de recusados. Angustiado, o jovem explicou: “Tive de fazer meus últimos exercícios físicos e uma corrida esta manhã. Perdi peso por isso.” O enfermeiro auxiliar foi atrás dele até o corredor e lhe deu uma moeda de 25 centavos: “Desça e compre uma caixa de leite chocolatado”. Sem entender nada, o candidato lhe perguntou: “Por que você quer uma caixa de leite agora?”
“Não é para mim, é para você.”
“Não seja ridículo. Não estou com sede.”
O enfermeiro auxiliar olhou para o candidato como um pai corrigindo um menino levado: “Ouça, moço, uma caixa de leite chocolatado tem um quarto de galão e pesa mais de duas libras.” Depois que o jovem voltou com o leite, o enfermeiro auxiliar o observou tomando o leite todo e, então, aproximou-se do médico:
“Major, o senhor me faria o favor de pesar de novo esse último candidato?”
“Já o marquei como reprovado. Ele não alcançou o peso.”
O enfermeiro auxiliar, porém, insistiu, e o médico atendeu seu pedido. Quando o candidato subiu na balança mais uma vez, o enfermeiro deslizou o contrapeso pela escala graduada até o ponto de equilíbrio.
“Cento e vinte libras, Major.”
“Você tem muita sorte, jovem. Passou raspando.”
Dito isto, o médico fez um novo apontamento no prontuário e colocou o arquivo do candidato na caixa intitulada “ACEITOS”.
O candidato foi o 12º aluno de sua turma, ao graduar-se, em 1961, e durante 33 anos de uma carreira brilhante ele voou aeronaves F-4 Phantom II sobre as densas florestas do sudeste da Ásia, em apoio aos soldados de infantaria, bem abaixo. Voltando aos Estados Unidos, exerceu uma pluralidade de funções no transcorrer dos anos seguintes, inclusive cargos de grande importância no Pentágono. Além de caças, ele também voou aeronaves de treinamento, de transporte C-141 e, subseqüentemente, bombardeiros B-52. Tornou-se comandante de ala e foi promovido a general. Durante uma inspeção inesquecível em uma base situada no norte dos EUA, como general comandante das equipes do inspetor-geral do Strategic Air Command (SAC), desembarcou de sua aeronave e, como de costume, solicitou uma viatura. O comandante da ala lhe apresentou uma agenda para a visita, mas o general tinha sua própria agenda. Sem o séquito habitual, dirigiu ao longo dos aviões enfileirados e parou junto a uma aeronave em que um soldado estava trabalhando. Saindo do carro sob o vento congelante, o general perguntou ao soldado como ele podia fazer a manutenção da aeronave usando grossas luvas árticas. “Não é lá muito fácil, General, mas está tão frio aqui fora que se eu tocar no metal de mãos nuas minha pele grudará nele, congelada.” O general, então, comunicou ao seu grupo de inspeção que voltasse a com ele se reunir em sua aeronave; em vez desta, eles iriam inspecionar outra base mais ao sul. O comandante da ala disse que ele não podia fazer isto. Sorrindo, o general disse-lhe: “Coronel, não é seguro trabalhar em uma aeronave aqui. Voltarei em outra época, quando as condições atmosféricas forem mais adequadas. Entrementes, se discordar de minha decisão, ligue para o General Davis, no Quartel-General do SAC e diga-lhe.” Com isto, o grupo de inspeção partiu.
Durante o período em que o general esteve no Pentágono, alguns membros das forças armadas da Alemanha Oriental, durante uma inspeção em uma localidade na área do Pacto de Varsóvia, mataram um major do Exército [dos EUA]. O general foi incumbido da tarefa de redigir uma diretriz estabelecendo procedimentos minuciosos para notificar as forças do Pacto de Varsóvia quanto a todas as necessidades futuras de inspeção. Esses procedimentos também se aplicavam às forças do bloco soviético quando eles levassem a efeito inspeções em instalações na área da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Essas diretrizes escritas pelo general foram aprovadas e assinadas, em uma cerimônia formal, pelo presidente da Junta de Chefes de Estado-Maior e por seu homólogo soviético.
Um dos melhores momentos da carreira do general ocorreu quando ele se tornou comandante combatente do SAC—na verdade, seu último comandante. Ele também organizou a estruturação do US Strategic Command após o colapso da União Soviética e a desativação do SAC, do Military Airlift Command e do Tactical Air Command. Enquanto esteve na Base Aérea Offutt, Nebraska, ele trabalhou de maneira incansável para aprimorar as condições de vida do pessoal que residia na base e fora dela e para aperfeiçoar o Centro de Educação Física de Offutt. Em poucas palavras, ele foi um líder que cuidou de pessoas que cuidavam da missão. Relatei apenas algumas de suas realizações em uma carreira muito produtiva que durou mais de três décadas. Esta narrativa, porém, não se refere apenas a alguns dos êxitos do Gen George L. Butler, o candidato à Academia que se tornou general. Também enfatiza o efeito que uma pessoa pode ter em outra, bem como os benefícios decorrentes dessa influência.
O general seria o primeiro a dizer que, não fosse pela preocupação e consideração que lhe demonstraram dois militares no remoto ano de 1957, ele jamais teria tido a oportunidade ou a autoridade para ajudar todo o quadro de praças e graduados. Seus êxitos não beneficiaram apenas os militares da Força Aérea, mas, também, afetaram favoravelmente nossas Forças co-irmãs e aliados da OTAN. Talvez o jovem enfermeiro auxiliar e o sargento do rancho jamais tenham compreendido a importância da contribuição que fizeram à defesa de nossa nação. Eles jamais receberão uma medalha ou uma placa em reconhecimento ao que fizeram pela Força Aérea. Se o candidato a quem eles ajudaram salvou, mais tarde, uma vida no Vietnã, eles também participaram da salvação dessa vida. Se as diretrizes e procedimentos que o candidato acabou preparando para lidar com um adversário que detinha armas nucleares impediu mal-entendidos e, possivelmente, um incidente nuclear, então eles também ajudaram a tornar o mundo um lugar mais seguro. Se o futuro general disponibilizou alojamentos nas bases para praças e graduados no intuito de aliviar a carga econômica de quem cria família, então eles merecem um pouco da gratidão do pessoal beneficiado.
Todos sabemos que combinar hidrogênio com oxigênio produz água, mas nem todos sabem que, para isso, é preciso um catalisador para unir esses elementos. Nesta estória, muitas pessoas talvez tenham conhecimento do General Butler e de suas realizações, do resultado de suas ações e do modo pelo qual algumas pessoas foram por elas beneficiadas. Contudo, pouquíssimas sabem que nenhuma das realizações do general jamais poderia ter ocorrido sem os esforços de dois militares que, agindo como catalisadores, se deram ao trabalho de ajudar alguém. O general tentou, ao longo de toda sua carreira, encontrar esses dois homens que se importaram com ele, para agradecer-lhes, mas não conseguiu. Espero que agora os leitores deste periódico possam tributar-lhes a devida apreciação, bem como a um número incontável de outros que silenciosamente fazem diferença em nossas vidas. Será que você pode fazer diferença? Provavelmente mais do que você jamais poderá saber.
Colaborador
O Suboficial R1 John P. Hearn (Bacharelado, University of Maryland University College; Bacharelado, Magna Cum Laude, University of Maryland University College, Naval Air Station Keflavik, Islândia; Associates Degree em Instrução de Tecnologia e Ciência Militar, Community College of the Air Force, Maxwell AFB, Alabama) exerceu a função de superintendente do 96º Esquadrão das Forças de Segurança (Air Force Materiel Command), na Base Aérea Eglin, Flórida, antes de passar para a reserva em 1º de abril de 2007. Foi Chefe das Forças de Segurança, 332º Esquadrão das Forças de Segurança Expedicionárias, Base Aérea de Balad, Iraque. Exerceu, também, as seguintes funções: Chefe de Inspeção das Forças de Segurança do Comando, Gabinete do Inspetor-Geral, QG do Comando de Material, Base Aérea Wright-Patterson, Ohio; Instrutor e Chefe de Divisão, Escola de Graduados de Nível Hierárquico Superior, Escola de Pós-Formação de Graduados, Base Aérea Maxwell/Anexo Gunter, e Primeiro-Sargento, 7º Esquadrão de Polícia da Aeronáutica (Provisório), Força-Tarefa Combinada, Guantânamo, Baía de Guantânamo, Cuba. O Suboficial Hearn concluiu o curso da Escola de Graduados de Nível Hierárquico Superior, Base Aérea Maxwell/Anexo Gunter, Alabama.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Navegou, comprou, ganhou...

Bill Gates, o fundador da Microsoft, anunciou na semana passada que a empresa vai pagar a quem usar parte de seu serviço de pesquisas na internet. A proposta é tema de uma reportagem de VEJA desta semana, que explica por que Gates tomou tal decisão, e mostra como vai funcionar o esquema da gigante dos softwares.
As buscas estão entre as atividades preferidas das cerca de 1,2 bilhão de pessoas que usam a internet em todo o mundo, segundo estimativas das Nações Unidas. Neste segmento, o Google é imbatível, dominando 60% das pesquisas feitas nos Estados Unidos. No restante do mundo, a lavada do Google segue a mesma proporção.
Para reverter este quadro, Gates lançou o Live Search Cashback, espécie de programa de fidelização de clientes. Funciona assim: quem fizer comparações de preços no site da Microsoft (search.live.com/cashback) antes de comprar algum produto na web terá como crédito uma pequena porcentagem do valor da aquisição. No momento em que o usuário acumular 5 dólares, receberá um reembolso numa conta bancária, pelo correio, ou como crédito no serviço on-line PayPal. O sistema conta com 10 milhões de produtos de 700 companhias, mas só está disponível nos EUA.
Da veja.com.br e internet

quinta-feira, 1 de maio de 2008

The Wall Street Journal endossa investiment grade dado ao Brasil

A elevação do Brasil ao grau de investimento é um "endosso" das mudanças econômicas e políticas vividas pelo País nos últimos anos, afirma nesta quinta-feira uma reportagem do jornal financeiro The Wall Street Journal.
Como outro grande veículo financeiro estrangeiro - o britânico Financial Times -, o WSJ repercute a decisão da agência de crédito Standard & Poor´s de melhorar a análise de risco do Brasil, atribuindo ao País um status de menos propenso à inadimplência.
"Outrora economicamente instável, o Brasil conseguiu estabilizar sua economia e tem desfrutado de crescimento econômico previsível com cada vez menos interferência política", avalia o WSJ, para quem a mudança "deve atrair mais recursos" para a maior economia latino-americana.
"Muitos no Brasil vêem o grau de investimento como o sinal mais claro de que o País entrou no mapa mundial".
A reportagem lembra que o Brasil deu início às reformas econômicas para "pôr a casa em ordem" ainda nos anos 1990. Nas palavras do repórter, a "divisão de águas" foi a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002.
"(Lula) Da Silva surpreendeu observadores deixando intactas as políticas econômicas de seu predecessor".
O País também foi impulsionado pela elevação dos preços das commodities, como soja, carnes, café e açúcar, lembra o texto.
Segundo a reportagem, "alguns investidores temem que o avanço do Brasil, amparado pelas commodities, acabará por desacelerar".
"Entretanto, desta vez o Brasil tem mais a oferecer, incluindo uma crescente demanda por todo tipo de mercadoria, como carros, roupas e educação".
BricA mudança no status do Brasil no ranking da S&P também foi publicada na edição desta quinta-feira do jornal financeiro britânico Financial Times.
Na mesma linha do seu par americano, o FT lembra que a elevação "reflete a emergência de São Paulo como o centro financeiro da América Latina, o baixo nível de exposição de crédito dos bancos brasileiros e a força das pequenas e médias empresas no País".
O jornal também lembra a eleição de Lula em 2002, quando houve certa nervosismo no mercado. "Mas temores de um desastre econômico foram compensados por um melhor gerenciamento fiscal, política monetária agressiva e independência para o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles".
O FT lembra que a mudança "coloca o Brasil em linha com outros países do Bric - Rússia, Índia e China - que desfrutam do grau de investimento" e "abre o caminho para uma aceleração do investimento no gigante latino-americano".

Ford perde o boom do setor automotivo no Brasil

No próximo mês de outubro, a Ford comemora os 100 anos do lançamento de seu modelo mais famoso, o Ford T. Foram mais de 15 milhões de unidades vendidas em 20 anos -- feito que consagrou a Ford como a maior e mais poderosa montadora do mundo. Um século depois, restam poucos sinais dessa exuberância. A Ford atravessa a pior crise de sua história -- só no ano passado a empresa registrou 2,7 bilhões de dólares de prejuízo -- e não há sinais de que a situação melhorará a curto prazo. Para estancar a sangria, Alan Mulally, o presidente mundial da Ford, chegou a penhorar a própria marca. Em meio a uma sucessão de más notícias, o sucesso da operação brasileira dava certo alento aos executivos da montadora, que há quatro anos registrava lucros sucessivos no país -- o último, em 2007, foi de aproximadamente 1,5 bilhão de reais. Isso até o início deste ano. No primeiro trimestre de 2008, as vendas da Ford cresceram apenas 1% em relação ao mesmo período de 2007, segundo dados recentes da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave). No mesmo período, suas maiores concorrentes, Fiat, Volkswagen e General Motors, tiveram crescimento médio de 30% nas vendas. A participação de mercado da Ford, que era de 13% no início de 2007, caiu para menos de 10% no início deste ano, considerado até agora o melhor momento da indústria automobilística brasileira. "A Ford é a única das grandes montadoras que não está conseguindo surfar a onda do setor automotivo", diz um analista de uma grande consultoria.
Há duas razões que explicam esse desempenho da operação brasileira da Ford nos últimos meses. A primeira está relacionada ao ritmo de produção da montadora. A maior e mais moderna fábrica da Ford -- localizada em Camaçari, na Bahia, e considerada modelo mundial de eficiência -- opera no limite de capacidade desde 2004. São 250 000 unidades produzidas por ano -- um carro a cada 80 segundos. Não há espaço físico para aumentar a produção de dois dos modelos de maior sucesso da subsidiária brasileira: o EcoSport e o Fiesta. Nos últimos quatro anos, a demanda por esses dois veículos aumentou cerca de 50%, sem que a produção fosse ampliada. A baixa flexibilidade da outra fábrica da Ford, em São Bernardo do Campo, no ABC paulista, impede que a unidade também produza os modelos de Camaçari. Esse quadro de esgotamento momentâneo da capacidade produtiva -- problema que vem prejudicando empresas dos mais diferentes setores -- foi agravado pelos efeitos de acordos sindicais assinados pela Ford no ano passado. Entre os termos negociados, estava a substituição, na Bahia, das coletivas de fim de ano pela parada dos trabalhos no Carnaval. A linha de produção parou 14 dias em fevereiro. Devido a esse intervalo, deixaram de ser produzidos 12 800 veículos. Resultado: sem carros para abastecer as concessionárias, as vendas do Fiesta no trimestre caíram 21%. No caso do EcoSport, a fila de espera subiu de três para cinco meses. Como acontece com outros produtos, o desabastecimento no varejo costuma ser fatal. Na ausência de sua primeira opção, o consumidor -- agora com crédito farto -- parte para alternativas. "Passamos por problemas circunstanciais e já esperávamos uma redução nas vendas neste trimestre", diz Rogelio Golfarb, diretor de assuntos corporativos da Ford para a América do Sul. "Mas vamos recuperá-las até o fim do ano."
Além dos gargalos na produção provocados pela aceleração sem precedentes da demanda, a Ford tem uma linha de produtos considerada envelhecida por especialistas do setor automobilístico. Dos dez modelos que a montadora vende no mercado brasileiro, apenas três registraram aumento expressivo nas vendas no primeiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período de 2007: o Ka, a Ranger e o EcoSport. São justamente os modelos que, no final do ano passado, receberam novas versões, com linhas mais modernas e mais tecnologia embutida. Os demais veículos da marca, concentrados sobretudo no segmento de sedãs e picapes, tiveram queda de, em média, 15% nas vendas em comparação com o primeiro trimestre de 2007 (as vendas do modelo Courier cresceram tímidos 10%). Lançamentos como o C4 Pallas, da Citroën, e o novo Corolla, da Toyota, que chegaram ao mercado entre meados de 2007 e o início deste ano, têm avançado sobre o mercado do Ford Focus e do Fusion. "A indústria automobilística vive de novidades", afirma um consultor próximo à Ford. "E a montadora tem demorado para reagir ao avanço dos concorrentes, mais velozes e ousados."
Os problemas da Ford
Desde o início do ano, a montadora tem deparado com uma série de problemas, que acabaram tendo impacto direto nas vendas. Abaixo, os principais:
Falta de capacidade instaladaAprincipal fábrica da Ford, em Camaçari, na Bahia, opera no limite desde 2004. Não há espaço para aumentar a produção dos modelos mais requisitados, como o EcoSport
Linha de produto envelhecidaAlguns dos sedãs da Ford, como o Focus e o Fusion, acabaram perdendo espaço para modelos mais novos, como o Corolla, da Toyota, e o C4 Pallas, da Citroën
Paralisação nas fábricasEntre dezembro de 2007 e fevereiro deste ano, as três fábricas da Ford pararam por cerca de dez dias. Além disso, a fábrica em São Bernardo parou por um mês para adaptar sua linha ao novo Ka. Esse intervalo teve impacto direto nos estoques das concessionárias
PARA TENTAR REVERTER essa situação, a Ford deve atacar em duas frentes. A primeira refere-se à renovação de sua linha de produtos. Mais da metade dos 2,2 bilhões de reais que a montadora pretende investir no Brasil nos próximos quatro anos será dedicada ao lançamento e redesenho dos atuais modelos. Só para 2008, estão previstos quatro novos carros. Um deles, o Edge, produzido no Canadá, deve marcar a estréia da Ford num dos segmentos que mais crescem no país, o de utilitários de luxo. O Focus europeu, um dos maiores sucessos da montadora, também deve chegar ao país. Paralelamente, a Ford vai expandir sua produção regional. Com investimento de 320 milhões de dólares, a empresa vai ampliar em 12% a capacidade instalada de sua fábrica em Pacheco, na Argentina, que enviará mais carros ao Brasil. Outra parte do investimento será alocada para as fábricas brasileiras, com o intuito de aumentar a eficiência das linhas já existentes. Para montar o novo Ka, por exemplo, a Ford já conseguiu um ganho de 26% na produtividade -- o que significa aumento de mais de 15 000 unidades por ano. "Neste ano, a Ford deve aumentar as vendas, mas dificilmente irá recuperar participação de mercado", afirma o consultor Juliano Alquati, da CSM Auto, especializada no setor automotivo.
As dificuldades enfrentadas pela Ford no Brasil chamam a atenção para um problema: o dilema que as empresas enfrentam ao investir em mercados sujeitos a instabilidade econômica e forte oscilação de demanda. Para uma montadora de automóveis, ampliações de linhas de produção implicam desembolsos que podem chegar facilmente à casa do bilhão de reais. Com exceção da Fiat, nenhuma outra montadora deve ampliar significativamente sua capacidade instalada nos próximos dois anos, mesmo com as vendas batendo sucessivos recordes. As subsidiárias se ressentem da vertiginosa queda nas vendas registrada entre 2001 e 2003, logo após a realização de maciços investimentos em novas fábricas. Nesse período, estima-se que o prejuízo acumulado pelas 14 fabricantes de veículos instaladas no país tenha somado quase 5 bilhões de dólares. A Ford, que havia investido mais de 1 bilhão de dólares no projeto de Camaçari entre 1999 e 2002, foi justamente quem registrou as maiores perdas na época: mais de 1,5 bilhão de dólares. Desde então, a montadora aumentou a parcimônia com relação a seus investimentos no Brasil. "É natural que a matriz seja mais cautelosa quanto aos investimentos", afirma Corrado Capellano, da consultoria Creating Value, especializada no setor automotivo. "Qualquer soluço no mercado pode corroer os lucros da subsidiária brasileira." E, em meio à atual crise na matriz, a Ford definitivamente não pode se dar ao luxo de correr esse risco.
Por Carolina Meyer da EXAME